Artigo de Opinião: Em home office sem aviso prévio

26 de junho de 2020 - 14:43 # # # #

O serviço profissional conduzido em casa não é novidade para ninguém no mundo dos negócios. O que não se sabia é que a maioria de nós seríamos impedidos de acessar o local de trabalho e obrigados fazê-lo em casa, o que é um contexto muito diferente do que se conceituou como home office. Essa modalidade trazia embutida em si a condição da escolha e a adaptação do ambiente doméstico ao exercício profissional. O que vimos como resultado da pandemia, foi a transposição, sem aviso prévio ou treinamento, dos colaboradores para o trabalho no lar.

Temos um novo cenário. O trabalhador acordou em casa, não perdeu o emprego, mas não saiu para trabalhar. Infelizmente o desemprego chegou para muitos, e exatamente para não engrossar as fileiras dessa categoria ou aumentar as estatísticas, os mais diferentes profissionais tiveram que forçar a elevação da curva da aprendizagem e conseguir lidar com inúmeros recursos tecnológicos para comunicação, reuniões, tomada de decisões, compartilhamento de arquivos e imagens, além de compartilhar com o trabalho, o seu bem mais precioso, sua vida privada.

Na contramão da concessão parcial de sua vida pessoal, esta, por outro lado, mergulhou na vida profissional sem negociação ou alternativas. Filhos, cônjuges, pets, e mesmo a casa vazia, nos foram lançados no cerne das tarefas laborais. Reunião em curso e, ao mesmo tempo, toda a vida doméstica, com seus afazeres e demandas dos familiares, também obrigados a ficar em casa. Somado ao trabalho profissional, simultaneamente, há o trabalho da casa: roupa, comida, limpeza, organização, higiene, etc. A cereja do bolo: redes sociais invadidas pelo trabalho. As fronteiras entre o privado e o laboral caíram, assim como o relógio de ponto e, muitas vezes, o horário de início e fim de expediente.

Todas as comparações sobre trabalhar em casa e na empresa saltam aos olhos. Há vantagens e desvantagens, como o óbvio de toda situação na vida. Entretanto, estamos em um contexto de privação de contato e da liberdade de ir e vir. Forçados ao distanciamento social, que implica em muitos casos, no distanciamento familiar, amoroso e fraternal, além do meramente físico e social. Lidar com as mais diferentes situações que daí surgem, pode despertar em muitos os sentimentos de ansiedade e inadaptação. O novo normal ainda não chegou e ainda estamos aprendendo a aceitar e a conviver com a atual realidade.

Listar o que fazer para superar a ansiedade, a angústia, a dúvida e as incertezas nesse momento pode soar como uma receita de bolo ruim. De fato, pensemos em uma dieta, na mesma hora em que se diz “você não pode mais comer isso ou aquilo ou, agora você tem que comer tais alimentos”, vem em mente a lembrança vívida exatamente daquilo que não se pode comer, com todas as suas deliciosas tentações. Em seguida, para muitos, uma revolta contra a dieta… ou pelo menos, a visão de seja sofrida, e uma obrigação.

Passar atividades e recomendações para uma dieta emocional pode resultar em um conjunto de prescrições tão difíceis de serem seguidas quanto uma dieta alimentar. Cada pessoa de uma maneira única de lidar (ou não) com suas dificuldades, ansiedades e expectativas, sendo assim, nesse momento, é muito salutar olhar para dentro de si e identificar aquilo que acalma, fortalece e motiva. Descobrir os gatilhos de estados emocionais favoráveis é tão importante quanto saber o que deixa a cada um abatido. Isso requer uma atitude reflexiva que, para os mais imediatistas, perfil natural da contemporaneidade, pode ser muito difícil.

Apesar dessas considerações, existem algumas práticas que podem contribuir para a melhor adaptação a esse novo anormal. Sim, novo anormal, lembra que a vida sempre muda de rumos quando a gente menos espera e foge, muitas vezes dos nossos planos? O normal muda, fica anormal, e somos obrigados a aprender a lidar como isso, como se diz popularmente: “eu que lute”. Cientes disso, percebemos que aprender a aprender é uma capacidade indispensável para o viver bem, sendo assim, testar recomendações que deram certo para algumas pessoas nos dá a possibilidade de aprender um novo caminho para o equilíbrio interno e externo.

Não passando uma lista do “que fazer em tempos de crise”, mas, sugerindo ações que podem ajudar a lidar com as condições atuais de vida, destacamos a importância de alguns fatores e sugestões que podem ser checados por cada um para verificar sua pertinência, coerência com o estilo pessoal de cada um e que seja de viável execução:

Marcar a passagem do tempo – determinar a hora de acordar, de dormir, de fazer as refeições, de iniciar o trabalho e de encerrá-lo também, e determinar um momento para o lazer, além do descanso.

Marcar a passagem de atividades – não passar o dia todo de camisola ou pijama, escolher uma roupa para usar ao iniciar o trabalho, e retirá-la ao encerrar o expediente (lembre-se que este deve ter hora para acabar). Ter meios de marcar a hora do descanso, do lazer e de outras atividades da vida além do trabalho.

Realização de atividades físicas – por menor que seja, elas vão ajudar na circulação sanguínea, a oxigenar o cérebro e a liberar alguns dos hormônios do prazer.

Buscar atividades prazerosas – quaisquer que sejam, mesmo rever fotos antigas, relembrar bons momentos, contatar amigos, fazer vídeo conferências com eles, cantar, dançar, ou outras atividades, são práticas que elevam o estado de humor e assim ajudam no enfrentamento das dificuldades.

Pedir ajuda – se não estiver bem, peça ajuda. É muito importante acionar nossa rede afetiva ou buscar um profissional. Não há necessidade de sofrer sozinho. Todos precisamos de ajuda para avançarmos e progredirmos na vida. Não há nada desqualificador nisso. Está mais próximo da solução quem pede ajuda do que aquele que não reconhece que precisa ser ajudado.

Uma frase a se considerar em momentos de crise ou de dificuldades: “Se pensar, não consigo, não dá, o cérebro paralisa. Se pensar em como fazer, o cérebro começa a buscar respostas”.